O Ministério Público do Estado do Piauí (MPPI), por meio do Núcleo de Promotorias de Justiça de Defesa da Mulher Vítima de Violência Doméstica e Familiar (Nupevid), do Núcleo de Atendimento às Vítimas (Navi), do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça Criminais (Caocrim) e do Centro de Estudo e Aperfeiçoamento Funcional (Ceaf), promoveu na manhã desta segunda-feira (14) o II Ciclo de Diálogos sobre a Lei Maria da Penha.

O objetivo foi debater temas importantes no enfrentamento à violência doméstica e familiar contra a mulher, com mediação da coordenadora do Nupevid/MPPI, Amparo Paz, e do coordenador do Caocrim, promotor de Justiça Luciano Ramos.

Além disso, a atividade visa ao cumprimento da Recomendação nº 89/2022-CNMP, que dispõe sobre a criação da semana Ciclo de Diálogos da Lei Maria da Penha, a ser realizada anualmente, no mês de agosto, em todas as unidades e ramos do Ministério Público brasileiro.

Durante a abertura do evento, Amparo Paz ressaltou a necessidade de aprimorar uma cultura voltada nos direitos humanos e no respeito mútuo, além de frisar que são alarmantes os dados referentes à violência contra mulheres e meninas.

Promotora de Justiça Amparo Paz.

“É preciso sensibilização e acolhimento das vítimas e mesmo de alguns familiares, buscando a não revitimização. Em 2022, todos os registros de violência contra a mulher tiveram significativo aumento”, disse.

A promotora de Justiça também chamou atenção para a recente tipificação da violência psicológica para a defesa dos direitos das mulheres. Conforme Amparo Paz, esse tipo de violência ainda é subnotificada e mesmo difícil de identificar pelas próprias vítimas.

“Ela não deixa marcas físicas, mas marcas na alma difíceis de cicatrizar. Precisamos nos dedicar mais para identificar e acolher da forma mais adequada possível, em toda a rede de proteção e atendimento”, frisou.

Em seguida, o promotor de Justiça Luciano Lopes agradeceu as presenças e ressaltou a importância de Esperança Garcia, considerada a primeira advogada do Brasil, que dá nome ao Centro de Referência.

Promotor de Justiça Luciano Lopes.

“Violência contra a mulher: como identificar e enfrentar?”

A primeira palestra, ministrada pela coordenadora do Centro de Referência Esperança Garcia, assistente Social Roberta Oliveira, abordou o tema “Violência contra a mulher: como identificar e enfrentar?”. Ela explicou que a violência contra as mulheres se configura quando elas são agredidas por serem mulheres, desde o assédio moral até o homicídio, e que o Centro de Referência trabalha de forma sigilosa para a proteção das vítimas.

Coordenadora do Centro de Referência Esperança Garcia, assistente Social Roberta Oliveira.

Roberta Oliveira também pontuou que um contexto histórico, cultural, social e religioso reproduz a violência contra a mulher de formas diferentes ao redor do mundo, e ela seria ocasionada por uma relação de poder que inferioriza o lugar da mulher na sociedade

“É uma questão histórica que precisamos combater. Ela pode ser visibilizada em casa, por parte do pai, do marido, por não obedecê-los. No trabalho, por assédio sexual. Nas ruas, pela violência física. Na vida íntima, quando ela é obrigada a ter relação sexual como e quando seus maridos querem. Algumas não percebem que isso é uma violência, porque entendem que é um dever seu enquanto companheiras”, pontuou.

A coordenadora do Centro de Referência Esperança Garcia ainda destacou que é necessário sensibilizar as vítimas para que busquem ajuda e consigam sair do ciclo de violência. “A rede especializada tem a expertise para isso. Muitas vezes, existe a dificuldade da vítima se identificar como tal e sair dessa situação. Por isso, é importante fortalecer essas mulheres. A violência psicológica inicia esse ciclo, colocando as vítimas em situação de fragilidade emocional”, disse.

Para isso, é necessário que a rede de apoio consiga conquistar a confiança das vítimas, para que se sintam confortáveis em expor o que estão passando e buscar ajuda, atitude que pode ser interrompida pelo medo de ser morta pelo agressor.

“Violência psicológica contra a mulher e a desnecessidade de laudo pericial”

O promotor de Justiça do Ministério Público do Paraná Thimotie Heemann colaborou com o debate com a palestra “Violência psicológica contra a mulher e a desnecessidade de laudo pericial”. Durante a sua exposição, ele destacou que a exigência de laudo pericial decorre em revitimização.

Promotor de Justiça do MPPR, Thimotie Heemann.

Ele apontou a importância o acréscimo do Art. 147-B do Código Penal, que regula a violência psicológica desde a Lei Maria da Penha, de 2006. Isso porque, entre os tipos de violência doméstica e familiar, a psicológica era a única que não possuía um crime correlato, como a violência sexual, patrimonial e o homicídio.

“A vítima era salvaguardada mas, na hora de responsabilizar o agressor, havia essa lacuna. Essa previsão sobre a violência psicológica vem proteger mulheres e meninas quanto ao não enquadramento de outras violências”, explicou o promotor de Justiça.

Conforme Thimotie Heemann, é necessário considerar que o dano emocional é perceptível sem a necessidade de exame pericial, diferente do dano psíquico.

“Danos emocionais derivam de choro, super irritação, insônia, hiper vigilância, rememoração constante, perda de concentração, transtornos alimentares, perda de capacidade laboral. Nós conseguimos perceber esses danos, que caracterizam a violência psicológica. Podem ser comprovados por depoimento, foto, vídeo, prints de conversa, depoimento de testemunhas e mesmo pelo próprio juiz ao proferir uma sentença”, defendeu o promotor. Ele ainda destaca que a exigência da perícia pode levar à revitimização.

Onde buscar ajuda?

As vítimas de violência doméstica e familiar podem buscar ajuda em órgãos como o MPPI, a Defensoria Pública, Centros de Referência Especializados, Delegacias da Mulher, abrigos, CRAS e CREAS.

Também é possível denunciar e pedir ajuda por meio dos canais nacionais 180 (Central de Atendimento à Mulher) e 190 (Polícia Militar), bem como do protocolo via Whatsapp “Ei mermã, Não se cale”, no Piauí, por meio do número 0800-000-1673, da Central de Flagrantes de Gênero com funcionamento 24h por dia e da Guarda Maria da Penha da Guarda Civil Municipal.

Já o Centro de Referência Esperança Garcia não é destinado à denúncia, mas acolhe mulheres por meio de demanda espontânea ou quando encaminhadas por instituição e profissional da rede, com funcionamento de segunda a sexta-feira, das 7h às 17h.