Texto divulgado pela 30ª Promotoria de Justiça de Teresina (Curadoria do Meio Ambiente.)
O mapa da área de aplicação da Lei 11.428/06 – Lei da Mata Atlântica, compreende 17 estados brasileiros, e dentre eles temos o Estado do Piauí, que possui 46 municípios dentro da área de abrangência da Lei, correspondente a 10,52% do seu território. A Lei é aplicada em 11 diferentes coberturas vegetais, e o Piauí possui duas delas, a Floresta Estacional Semidecidual e a Floresta Estacional Decidual, sendo a última a mais encontrada no Estado.
O processo insustentável de exploração do Piauí tem aumentado a cada dia, e consequentemente, a supressão da vegetação tem provocado mudanças estéticas, sociais, ambientais e econômicas irreversíveis para as florestas do Piauí. Recentemente uma grande polêmica criada no Piauí a respeito da presença dessas duas formações florestais enquadradas na Lei 11.428/06 tem incomodado grandes grupos do ramo do agronegócio, siderurgia e politicos. Para eles, a aplicação da Lei da Mata Atlântica, que protege a floresta, pode emperrar a economia do Estado.
É interessante observar que outros estados não contestam a Lei, e nem por isso pararam de crescer. O único estado que vai contra a Lei é Minas Gerais, onde os deputados e o próprio governo afirmam que a “mata seca” e não a Floresta Estacional Decidual, é que ocorre no seu território. Com isso, eles visam favorecer as siderúrgicas. Hoje, no Piauí, acontece algo parecido, pois a vegetação piauiense possui grande potencial para a produção de carvão, que também chega até as siderúrgicas de Minas Gerais.
Alguns pesquisadores, em defesa das empresas e politicos, não admitem as Florestas Estacionais Semideciduais e Deciduais no Piauí, e afirmam que no estado existe mesmo é a “caatinga arbórea”, que realmente se assemelha a decidual, pois esse tipo de caatinga existe em alguns lugares do Brasil.
Um mapeamento da Mata Atlântica e Ecossistemas Associados, feito pela Sociedade Nordestina de Ecologia (SNE) vai além e traz pontos importantes sobre a área de aplicação da Lei da Mata Atlântica, pois o mapeamento adotou as fisionomias definidas no decreto nº 750/93.
No Piauí, a legenda da vegetação mapeada foi: floresta estacional semidecidual montana (floresta tropical subcaducifólia); floresta estacional decidual Montana (floresta tropical caducifólia); e além disso a vegetação de dunas/ restinga (vegetação com influência marinha) e vegetação de manguezal (vegetação com influência fluviomarinha).
Trabalhos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), verificaram no Piauí o NDVI (Normalized Difference Vegetation Index – na sigla em ingles, ou o mesmo que (Índice de Vegetação por Diferença Normalizada), e revelam que a vegetação varia de acordo com o clima da região, confirmando que no Piauí existem florestas estacionais deciduais e semideciduais, em estações bem definidas.
O trabalho feito com imagens de satélite revela que a floresta estacional apresenta os maiores valores de NDVI. “Este comportamento ocorre porque a floresta tropical, adaptada a períodos secos, além de manter grande parte de sua folhagem durante a estiagem, é vegetativamente densa. Outro ponto importante é que os picos de máximos e mínimos valores de precipitação concentram-se neste domínio, fator que também influencia os valores mais altos de NDVI, uma vez que quanto mais seca a vegetação, mais rápida é sua resposta às chuvas.
E o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em publicação de 1993 deixa claro os dados do INPE, pois a floresta estacional constitui uma mata tropical que ocorre em regiões de duas estações definidas, uma seca e outra chuvosa, com espécies que perdem suas folhas na época da estiagem. Na floresta estacional semidecidual, 20% a 50% da folhagem cai no período seco, enquanto que na floresta estacional decidual a perda foliar chega a 50% ou mais, no mesmo período.
Recentemente pesquisas lideradas pela equipe da arqueóloga Niéde Guidon, sob a orientação da botânica francesa Laure Emperaire, revelam que durante quatro décadas estudos mostraram as características naturais da região da Serra da Capivara, realizando inclusive um inventário da flora, que aponta fortes elementos da Mata Atlântica, e também da floresta amazônica.
A denominação de “bioma” não tem agradado alguns políticos e poucos pesquisadores ligados a eles, pois procuram associar a Mata Atlântica a apenas uma floresta densa, próxima do oceano Atlântico com o famoso mico-leão-dourado. Existem até aqueles que confundem a população dizendo que a Lei não se aplica ao Estado do Piauí, mas esquecem de dizer qual é o real interesse político e econômico camuflado no discurso.
O que deve ficar claro para a sociedade é que na Mata Atlântica existem ecossistemas associados, cada qual com suas especificidades. E a falta de conhecimento, ou melhor, a carência de estudos mais aprofundados, também dificulta e alimenta discussõe. O problema é que enquanto isso acontece, a floresta vai sendo destruída. A biodiversidade incluída na Lei 11.428/06 no Piauí tem o papel fundamental de amenizar a pobreza e a desnutrição, além da mitigação e adaptação das mudanças climáticas. Vale destacar que a mata ajuda também a controlar o regime das chuvas, envolvendo todo o setor agrícola de uma determinada região afetando também sua economia.
A Área de Aplicação da Lei da Mata Atlântica é rígida porque são áreas de extrema importância biológica. E quando se fala em biologia não é somente os bichos e os vegetais, mas os seres humanos. O ano de 2011 foi escolhido pela ONU como o Ano Internacional das Florestas, para tentar aproximar todos os cidadãos sobre a importância de se preservar a mata, que cobre 31% das terras do planeta, sendo que o Brasil possui a maior parte.
Manter a floresta da Mata Atlântica, da Caatinga ou do Cerrado não significa retrocesso para a economia do Piauí, pois todos sabem que as características climáticas do Estado não permite a grande quantidade de desmatamento existente, afetando diretamente o desenvolvimento das cidades como o controle da erosão (evitando as tragédias), fornecimento de alimento (o Piauí pode perder 70,1% das terras cultiváveis até 2050), retirada de carbono, e principalmente, o suprimento de água. Ao contrário do discurso politico, manter a floresta preservada é necessário para equilibrar a vida e a economia do Estado do Piauí.
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Dionísio Carvalho Neto – Jornalista, ambientalista, Secretário Executivo do Conselho Municipal de Meio Ambiente de Teresina, e graduando em Gestão Ambiental